terça-feira, 15 de outubro de 2013

Filhos do deserto

Levastes o vento embora
O sopro de vida que ainda me restava
Agora sou capa, resistindo no deserto
E o frio que me segue
É como a peste da fome solta no ar
Moribundo ar

A minha porta não tem soleira
Sei que logo vais entrar
Protegei os filhos do deserto
Seja comigo Alá

Não temo o perigo
E nem a hora que virá
Entreguei meu coração de criança partido
Ainda assim, seja comigo Alá

Pelas lágrimas que escorreram do meu rosto
Pelo sangue que se verteu, sem se derramar
Pela súplica à Estrela de Davi
Que seja indolente a partida
E de mim só deixes o bem
Que o bem, o bem se perpetuará

domingo, 19 de maio de 2013

Ventos de maio

São dias difíceis
O ar? sufoca
O pensamento? sufoca
O coração? lateja
E nada do que eu vejo me distrai

São dias de dor
E meu corpo finje uma resposta
Aos últimos estímulos
Para sorrir

Não há consolo,
E a dor? Ahh.. é dor de alma
É dor de perda
É dor de parto, de partir

E não é para se morrer
Porque a vida quer as lágrimas
O rostinho de criança abandonada
Para o seu nobre hall
Dos homens que se entregam a toda forma de amar.

sexta-feira, 8 de março de 2013

Eu e ela e nosso eterno abismo...

Escrever me faz pensar melhor em tudo que aconteceu
Mas a última coisa que eu gostaria de ser era racional
As palavras foram ditas
Ferindo alma e coração
Sonhos são perdidos
Deixam-se rastros
Palavras
E rostos pelo chão
Tenho orgulho quando te digo que me banco
E de fato eu me banquei
Desenhei meus sonhos em tábulas rasas da minha mente
Planejei meandros
E a cada novo traço eu sorria pela graça do já feito
Mas de repente, tudo desmorona
Não são mais as minhas mãos que pintam a borda celeste
E se procura, em vão, domar cavalos selvagens
Descobri que a raiva e a risada não se contém
Ou se dá tudo ou não se dá nada.
E eu banquei as palavras
Esbravejei os meus e os seus horrores
Em troca de uma última aceitação
De nada valeu
O seu maternalismo soou em meus ouvidos como um não
Enquanto eu tentava te dizer que a menina cresceu
Tracei ainda cores sobre meu painel desgraçado por suas mãos
De nada adiantou
Irredutíveis diante de mim
Da melhor maneira, que era pra eu não duvidar
Entreguei a paleta cheia de novas cores e matizes
Sucumbi diante da própria culpa
Deixei a mulher que se parecia virtuosa morrer
Chorei baixinho o lamento dos corações despedaçados
Chorei por toda a inocência ainda contida em cada traço que desenhei
Na palma de sua mão
Que hoje me permanece fechada.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Sempre Viva




Gostar é mesmo coisa que não se ensina
Não se maquia
Não se maquina

Meu coração sempre esteve na curva de um rio
Na porta entreaberta
Na pausa de uma vírgula

Sim, a curiosidade me domina
Sou feita de infinitos
E de desatinos

E como criança no circo
Encanto-me é com o equilibrista
E às vezes me faço de um
Levo o que tenho de mais meu nas mãos
E o coração, pequenino como a dona,
É minha armada.

Neste momento não sei dizer ao certo o sentimento
Senão que quero um minuto mais
Contemplando os olhos que me miram
Em silêncio
Senão que preciso ver o sorriso contido
Enlarguecer.

A minha existência lembrará eternamente de ti
A minha memória guardará nem que seja o seu nome
Tu serás como a sempre viva do cerrado:
Manter-se-á vivo em mim, mesmo depois de já colhido e seco
Serás lembrado...

E hoje me fazes sorrir
Faze-me companhia
E com cuidado
Toma meu dia ,como se também fosse seu

Venha, entregue-me uma nova canção
Aplique mais uma dose de sua essência
Que aos poucos entrego-te o coração

Guardei-te em versos
Mas também te tramo em prosa
Em grande enredo
Que é para te ter inteiro
Em pausas maiores
Que me darão o fôlego necessário
Quando te faltares a mim e eu for só pedaços.

Fernando Pessoa tinha razão em dizer que viver não é preciso
A graça sempre vai estar no equilibrista
Que se arrisca
Ou na surpresa
No repente
Naquilo que não se contava
E quem dirá que não tem graça?

Eu continuarei a admirar, a me assombrar
A ter a maravilha e o medo
E a ânsia de descobrir
E quando nada mais em mim reluzir
Definitivamente
Enterrem o meu coração na curva de um rio.








quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Meus pêsames

Pena foi do seu capricho
Que jogou pro alto a felicidade
Que não deu crédito a saudade
E hoje amarga o desperdício

Pena foi o que eu senti
Pela criança que estendia as mãos
Pelo troco que ela esperava receber
Para saciar a sua sede de infância

Pena foi do fruto ainda verde
Que cutucado com vara curta
Caiu de insistência
Nas mãos daqueles moleques de rua

Pena eu senti de mim
Assistindo à TV
Enquanto pessoas comuns erguiam a voz e os braços
Protagonizando a dor e o caos também em meu nome

Pena eu senti de nós
Dessa fragilidade que consome
Do poderio que enlouquece
Da ingenuidade que preservamos
Quando ainda achamos que somos alguma coisa

terça-feira, 10 de abril de 2012

Anti-herói

Ele viu o dia amanhecer pedindo para esquecer a bala que lhe feriu
Implorando para que se estancasse a abertura indômita que incomoda e lateja
Pedindo para a lua voltar só mais um pouquinho,
Antes que o campo de batalha se escurecesse,
Antes que perdido ele visse o breu e tateasse lugares
Lá longe, ele vinha pisando em britas
Já sem armas, sem forças, sem nada
Saquearam-lhe a coragem e o viço.
Na vertigem, tudo era sangue
Ele era um homem só no caminho
Um homem a espera do primeiro raio
Um raio que vinha para ele próprio se ver ferido e perdido
Num caminho que ele não sabia para onde ia
E ele apenas caminhava

segunda-feira, 19 de março de 2012

O Viajante

Eu vou indo. Cheio de expectativa, excitação e receio. Estou de cara com o medo, com o desconhecido e seus segredos. Se me assusto, só o coração dispara, porque os pés continuam firmes ou pelo menos dispostos a caminhar.
Entro cru, mas, sobretudo, entro nu.
Vou preparado para receber a vestimenta que o rei ou o andarilho têm a me oferecer.
Na vontade, conto dias
Mas na saudade, sei que contarei horas.
Tudo é útil e vale a sua lágrima.
Tudo é singular e cabe eu olhar.
Na boca, as palavras que aprendi e que guardei. Mas chego sem nada, sem diálogos prontos, sem a apuração com a qual me avaliaram.
Porque no bom papo as coisas fluem e quem controla a conversa é quem escuta.
Sou de longe, eu sou de lá.
Da terra do sabiá, do fulano que sabe jogar, da mulata que sabe sambar;
De um povo que vive a sonhar, a prosear, a sorrir, a sofrer e a não ligar;
Sim, eu sou de lá.
Tudo, eu sei, será meio impactante. Até mesmo o sacolejar suave dos trens super rápidos que de uma estação a outra me farão experimentar da exultante organização e comodidade.
Em ruelas, distraído, quero caminhar contemplando as folhas secas caídas que ainda ei de pisar.
Em frente a monumentos que enunciam exuberância e graciosidade, não importando o estilo de seus criadores, eu quero fitar a história.
Não quero decorar suas placas e descrições, mas imprimir em mim as minhas próprias.
E o momento de registro se completará com a fotografia, que em grande parte resultará da boa vontade de mãos alheias. E dali, quando pouco, espero que fique o agradecimento. Mas não hesitarei a me render a uma boa conversa no restante do percurso, a um contato mais íntimo em um Café, a um troca de gostos, de culturas, de sorrisos, de línguas...

Estou de malas prontas. Mas o necessário não está ali.
O indispensável eu levo na minúcia do pensamento: a força de um desejo, a certeza de que tudo que posso ver e saber ainda não serão nada e de que vou pequeno, para voltar menor ainda
Porque infinitos são os caminhos ao redor do mundo. Um deles é o meu.
E Infinitas são as histórias de uma humanidade inteira e dos filhos teus.
Numa viagem é preciso saber o gosto de ir e de voltar.
De revisitar e de rememorar.
É preciso perspicácia para ver e contemplar maravilhas a luz do sol e a luz da lua.
É preciso percorrer distâncias ou não percorrer nada.
Porque viajar é a atividade do experimentar, do deixar-se ir continuamente
Do colocar o pensamento a serviço sempre das regalias, das travessuras e dos anseios daquilo que trazemos de mais lindo no peito: a vontade de ser.
Por isso, o verdadeiro viajante nunca se perde; ele descobre sempre novos lugares.