segunda-feira, 19 de março de 2012

O Viajante

Eu vou indo. Cheio de expectativa, excitação e receio. Estou de cara com o medo, com o desconhecido e seus segredos. Se me assusto, só o coração dispara, porque os pés continuam firmes ou pelo menos dispostos a caminhar.
Entro cru, mas, sobretudo, entro nu.
Vou preparado para receber a vestimenta que o rei ou o andarilho têm a me oferecer.
Na vontade, conto dias
Mas na saudade, sei que contarei horas.
Tudo é útil e vale a sua lágrima.
Tudo é singular e cabe eu olhar.
Na boca, as palavras que aprendi e que guardei. Mas chego sem nada, sem diálogos prontos, sem a apuração com a qual me avaliaram.
Porque no bom papo as coisas fluem e quem controla a conversa é quem escuta.
Sou de longe, eu sou de lá.
Da terra do sabiá, do fulano que sabe jogar, da mulata que sabe sambar;
De um povo que vive a sonhar, a prosear, a sorrir, a sofrer e a não ligar;
Sim, eu sou de lá.
Tudo, eu sei, será meio impactante. Até mesmo o sacolejar suave dos trens super rápidos que de uma estação a outra me farão experimentar da exultante organização e comodidade.
Em ruelas, distraído, quero caminhar contemplando as folhas secas caídas que ainda ei de pisar.
Em frente a monumentos que enunciam exuberância e graciosidade, não importando o estilo de seus criadores, eu quero fitar a história.
Não quero decorar suas placas e descrições, mas imprimir em mim as minhas próprias.
E o momento de registro se completará com a fotografia, que em grande parte resultará da boa vontade de mãos alheias. E dali, quando pouco, espero que fique o agradecimento. Mas não hesitarei a me render a uma boa conversa no restante do percurso, a um contato mais íntimo em um Café, a um troca de gostos, de culturas, de sorrisos, de línguas...

Estou de malas prontas. Mas o necessário não está ali.
O indispensável eu levo na minúcia do pensamento: a força de um desejo, a certeza de que tudo que posso ver e saber ainda não serão nada e de que vou pequeno, para voltar menor ainda
Porque infinitos são os caminhos ao redor do mundo. Um deles é o meu.
E Infinitas são as histórias de uma humanidade inteira e dos filhos teus.
Numa viagem é preciso saber o gosto de ir e de voltar.
De revisitar e de rememorar.
É preciso perspicácia para ver e contemplar maravilhas a luz do sol e a luz da lua.
É preciso percorrer distâncias ou não percorrer nada.
Porque viajar é a atividade do experimentar, do deixar-se ir continuamente
Do colocar o pensamento a serviço sempre das regalias, das travessuras e dos anseios daquilo que trazemos de mais lindo no peito: a vontade de ser.
Por isso, o verdadeiro viajante nunca se perde; ele descobre sempre novos lugares.